sábado, 3 de maio de 2014

Uma saída nada limpa

Estamos em Maio, e como se sabe é o mês da saída da troika e da "restauração da independência", citando Paulo Portas. Não há comentário possível ao quanto ridículo foi o episódio, protagonizado pela JP, Paulinho e associados, do relógio que conta as horas para a saída da troika, que demonstra um total populismo e desprezo pela realidade do país. Mas vamos ao que interessa:
Como é óbvio a troika não vai sair de Portugal, pelo menos na prática, as avaliações terão que continuar a acontecer e a dependência em relação ao BCE será uma constante. O que não me parece de todo mau do ponto de vista de governação do país, pois será imprimida um exigência extra ao actual e próximo governo, contudo a linha entre o que são as garantias dos credores e a intervenção na política interna será muito ténue, e veremos se não surgirá uma espécie de "memorando da troika II" não legitimado pela Assembleia da República. O que quero dizer com isto? Quero dizer que desconfio que este governo está, ou estará em breve, a executar mais uma agenda escondida. Uma agenda que vai de encontro às expectativas dos credores externos, bem como, às aspirações liberais deste governo. 
O memorando da troika, mais não foi do que uma constatação de problemas e imposição de soluções, que internamente já eram advogadas por sectores da sociedade civil. Curioso é que os anos passaram e os problemas, conhecidos de todos, foram ficando e foi preciso surgir alguém de fora para fazer-nos combater esses problemas, o que diz muito do que foi a realidade política da década de 90 e seguintes. Tinham que existir cortes, tinham que rever tabelas salariais e flexibilizar alguma legislação laboral e económica. Mas a versão inicial do memorando era equilibrada e ponderada, contudo, as sucessivas revisões e avaliações, quebraram, com o consentimento do actual governo, esse equilíbrio e houve uma total apropriação política do memorando como forma de legitimação da política liberal deste governo.
Mais impressionante é a indefinição pública que existe, ainda, quanto à saída do memorando da troika, e vive-se uma autêntica esquizofrenia quanto a este problema, o governo diz que quer uma saída "limpa", o PS inicialmente pedia uma saída "à irlandesa", agora já pede programa cautelar se as circunstâncias assim o exigirem. Bem, parece-me que é óbvio que tem que de existir um programa cautelar de apoio, os números da economia são claros, não existe crescimento económico, nem redução da despesa, que sustentam uma saída sem apoio externo. E a melhor solução é mesmo esta, serão quatro anos de sacrifícios que estarão em discussão até ao fim deste mês e somos todos interessados em que o governo não faça "all in" destes quatro anos para estarmos um ano nos mercados e sermos forçados a regressar ao apoio externo porque não tivemos redução da despesa, nem crescimento económico para sustentar a nossa dívida. Por fim, a decisão acerca da saída do programa da troika não será, surpreendentemente, uma decisão económica mas sim uma decisão política deste governo. O que parece-me ser o "não recomendável".
Um aspecto é certo, a saída, a acontecer, não será limpa e esperam-se mais dificuldades que irão expor ainda mais as fracturas deste país.

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